“Quem atravessa as correntes do Centro Histórico, não volta mais para casa”. A lenda urbana que circula a pacata e literária Paraty, no Rio de Janeiro, é algo a se ficar de olho. Não se assuste, mas parece real. Estive lá e fiquei hospedada na deliciosa Casa Turquesa.

Reportagem: Dani Féder
Fotos: Juju Possas
Apoio: Casa Turquesa

A Sol é argentina. Veio passar férias em Paraty e tanto gostou que voltou no ano seguinte para ficar alguns dias. É a mais nova proprietária do Hostel Chil Inn e nunca mais voltou para morar em casa.

A Dani, minha xará e jornalista como eu, tomou coragem de atravessar as correntes que separam o restante da cidade do Centro Histórico. Resultado: mora em Paraty há alguns anos. Trabalha numa pousada deliciosa e abandonou o jornalismo.

Marco era professor de Marketing em Belo Horizonte e já conhecia Paraty. A última vez que veio foi definitiva: comprou sem pestanejar um ponto comercial que transformou no Café DuBule e também uma pousada. Mudou-se sem nem mesmo fazer pesquisa de mercado.

A vida mansa é um convite à plenitude.

Volta no tempo em Paraty

Eu e a fotógrafa Juju Possas, minha companheira, visitamos a cidade estrategicamente no mês de agosto, pois é o mês que menos chove. Deu erro na previsão do tempo. Mesmo prontas para uma reportagem de ecoturismo, não houve nem um dia de sol. Surpresa: descobrimos algo diferente!

Paraty é cidadezinha colonial cheia de bossa. Casario pintado de branco com janelas coloridas, um charme que enfeita os olhos. Da terra indígena, iniciou em 1950 um pequenino vilarejo. O município que conhecemos hoje foi fundado pelos portugueses em 1636 e historicamente enriquecido pela exploração do ouro, ciclo do café e os engenhos de cana de açúcar. Por isto, famoso pelas cachaças (adoro). As belas praias e cachoeiras, das quais nem vi a cor, são belezas naturais – se der sol no seu agosto, me conta como é!

Para os turistas, a cidade é essencialmente o seu centro histórico (se você não for explorar a natureza ou tiver a sorte do tempo chuvoso, é claro). São poucas quadras e tudo é feito a pé, mas com muito cuidado por onde anda. O calçamento “pé-de-moleque” é original dos primórdios da cidade. Fácil de torcer o pé.

As ruas de pedra são um marco, assim como suas inundações. Já ouviu falar da “Veneza brasileira”? Tive a impressão de que a cidade estava afundando, mas tava tudo certo. É assim mesmo, molhado e poético durante as chuvas e sobretudo durante a lua cheia, que foi o meu caso.

O passeio a pé é o programa mais gostoso que você vai ter no Centro Histórico. Descobrir lugares charmosos, guiar-se pelos aromas e cores que exalam pelas ruazinhas de pedregulho… Sentir cheiro de passado é viver a história.

Casa Turquesa: hospedagem com energia delícia​

Suíte Branca, a suíte master da Casa Turquesa Maison d’Hôtes

Sem tempo aberto, o plano foi descobrir o roteiro de luxo da cidade. Nada mal, hein. Conversei com a querida Tetê Etrusco, proprietária do hotel boutique Casa Turquesa Maison d’Hôtes – um lugar com ótima energia. Ela presenteou Now Boarding com o cardápio completo que é sua hospedagem.

Gosto de receber pessoas. Vou mandar preparar
um quarto bem gostoso para vocês
. – Tetê

Foi assim que a viagem vestiu o tom de pura gostosura.

Dias antes, hospedei-me num Cinco Estrelas opulento no Rio de Janeiro (capital). E foi na Casa Turquesa que redescobri o turismo de luxo. Vamos fazer um combinado: a partir de agora, a gente entende que luxo significa delícia. Em 2008, a Tetê inaugurou o roteiro de luxo de Paraty criando a primeira pousada delícia da região. Mulher forte é assim: se não encontra o que quer, vai lá e faz.

Momento de leitura para os hóspedes: a biblioteca faz jus ao tema literário de Paraty.

São apenas 9 suítes, numa propriedade icônica com personalidade do século XVIII. O arquiteto Renato Tavolaro, especialista em casario colonial, projetou a restauração. Uau! Mas olha só, é nos detalhes que nascem os momentos marcantes:

Ao chegar, o staff já me chamava pelo nome e não economizava gentilezas. Fui mimada. Convidada a retirar os calçados para caminhar pela casa – tradição esquecida de Paraty – recebi Havaianas do meu número como souvenir. A visita guiada pela propriedade finalizou na suíte, onde já estavam minha bagagem, um lanchinho acompanhado do bilhete escrito à mão e a cama arrumada no que nomeei de “modo dia” (explico na sequência).

Já falei que adoro cachaça? A verdade é que o universo da boemia me encanta profundamente, o que fez de mim uma jornalista de turismo também especializada em bares e bebidas. O welcome drink é o Dry Turquesa, um coquetel autoral feito de cachaça, limão espremido e licor Curaçau Blue. Servido na taça de Martini e de coloração azul, segue a identidade visual azul da casa. Um coquetel contemporâneo de paladar doce e teor alcoólico moderado. Se você gosta de Cosmopolitan, vai adorar.

O hotel disponibiliza tudo o que um hóspede pode necessitar e não veio na bagagem: guarda-chuva, galochas, chapéu e sacola de praia e outros detalhes especiais. Quer se sentir rainha? Todos os dias, tem chá das cinco com bolo quentinho e todas as opções de chá que a Tetê vai garimpando pelo mundo. É o momento mais legal para conhecer os outros hóspedes. No meu caso, pratiquei inglês com um casal da califórnia que estava em lua de mel.

 

Arrumação da cama

Modo dia, modo noite e o mistério do acontecimento

A cama é envolvida por tecidos macios da Trussardi e protegida por mosquiteiros encomendados sob medida de artesãos. No modo dia, o mosquiteiro fica elegantemente aberto nas estruturas da cama.

Os travesseiros ficam de pé, abraçando almofadas. Já no modo noite, que se apresenta quando você volta do jantar, o mosquiteiro se fecha, convidando a adentrar o mundo mágico do sono. Envolto em Trussardi. As almofadas já caminharam sozinhas às poltronas para que os travesseiros se deitassem. Ali, pousa um chocolate. Comer um docinho após a refeição auxilia a digestão, acelerando o processo de fermentação no estômago.

Ninguém vê modo dia e modo noite acontecendo. Na primeira manhã, saí da suíte para o café da manhã, um banquete servido a qualquer hora do dia que você solicitar. Em alguns minutos, notei o esquecimento do meu livro e retornei ao quarto. A cama, que agorinha há pouco eu havia largado toda revirada, já estava no modo dia. Foi rápido.

No dia seguinte, tracei o mesmo roteiro só para testar a agilidade. O cenário se repetiu e eu nem vi sombra de alguém que houvesse passado por lá. Só pode ser bruxaria.

Gastronomia em Paraty

Ser jornalista de turismo é quase como ser crítica gastronômica. Quando a gente começa a conhecer coisa boa, fica cada vez mais difícil nos impressionar. Os melhores jantares em Paraty foram recomendações da equipe da Casa Turquesa: Thai Brasil – Rua do Comércio, 308 A | Punto di Vino – Rua Marechal Deodoro, 129.

Moral da história

Compreendi que prefiro um hotel boutique delícia a empreendimentos cinco estrelas, que são impessoais. Foi recebendo o presente de viver a delícia da Casa Turquesa Maison d’Hôtes que percebi (e não fui paga para escrever isto). Tive uma hospedagem que, de fato, fez a viagem. Vivi cada momento inspirando a energia de intimidade e conforto que a experiência proporciona.

No dia do check out, após o café da manhã tardio, sobre a cama no modo dia estavam mais souvenirs: o livro de receitas publicado pela casa e um colar com pedra turquesa sobre cada travesseiro, que eu e Juju temos usado como uma segunda aliança. Olho pra ele e lembro-me do que é o turismo-delícia.

Publicado na Now Boarding – dezembro/2019

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